A minha Bica

Um olhar de quem aqui nasceu...

segunda-feira, setembro 04, 2006

Conversa da Treta - O Filme


"As festas populares de Santo António parecem ter chegado mais cedo ao bairro lisboeta da Bica. No Largo de Santo Antoninho há balões de papel e fitas coloridas presos nos candeeiros e nas árvores que fazem sombra sobre as mesas de toalhas aos quadrados. Em vez das habituais sardinhas assadas, há restos de laranja e sobras de feijoada, deixadas em malgas e pratos de barro castanho.Não fossem os enormes projectores, os reflectores brancos e pretos, a câmara de filmar e o rebuliço que ali se instalou de repente e nem se perceberia que a Bica tinha dado lugar ao Bairro da Ladroa e as festas de Santo António à Feijoada Anual. Onde antes estava uma fonte, existe agora uma estátua a «El Infante D. Fuas Bogalho, ‘o atrofiado’», um distinto cavalheiro de chapéu e capa vagamente parecido com o actor José Pedro Gomes, em cima de um burro com enormes orelhas e as feições de António Feio. É o cenário de uma das cenas de Conversa da Treta – O Filme, que promete levar os famosos tugas Zezé e Toni às salas de cinema portuguesas, a partir de Outubro.«Procuramos o mesmo impacto que tivemos no teatro, na televisão e na rádio», afirma António Feio, acrescentando que «o grande objectivo é levar mais gente ao cinema». Para José Pedro Gomes, «o cinema é a forma de perpetuar o trabalho – o teatro é efémero, a televisão é consumida com rapidez, o cinema é o que fica para o futuro».
O filme (realizado por José Sacramento, com argumento de Filipe Homem Fonseca e Eduardo Madeira) não tem qualquer financiamento público, o que não impediu o produtor Leonel Vieira de levar a sua ideia em frente, tentando recuperar o espírito perdido do cinema de comédia português.Enquanto o elevador passaA longa-metragem fez nascer personagens, deu corpo a outras de que antes apenas se falava, criou novos cenários. Maria Rueff, José Raposo, Joaquim Nicolau, Marco Horácio, António Melo, Ana Bola, Rui Paulo, Carlos Curto, Bruno Nogueira e Manuel Marques foram os actores convidados para interpretar os amigos e familiares da dupla-maravilha. A história de Conversa da Treta – O Filme começa com Zezé numa cabina de peep-show, a ter uma visão apocalíptica, que o leva a entrar para a Ordem dos Caracolários Descalços e a ficar em clausura num mosteiro. Toni visita-o e juntos recordam peripécias antigas, entre elas o tal dia da Feijoa-da Anual do Bairro da Ladroa.Fato branco, camisa às flores coloridas, corrente e medalha douradas ao pescoço e bigodinho, José Pedro Gomes prepara-se para, mais uma vez, dar vida a Zezé. Ao lado, Feio veste um colete com padrão de vaca malhada, uma T-shirt vermelha e umas calças de ganga com remendos. Umas patilhas e um brinco na orelha esquerda completam a indumentária. Estão prontos a filmar e esperam apenas que passe o elevador da Bica, que, para cima e para baixo, vai interrompendo as filmagens. Lá dentro, os turistas sorriem e tiram fotografias quando passam pelo «arraial». José Pedro Gomes acena-lhes. «Estou a dizer adeus às miúdas», diz, divertido, a António Feio.Já são muitas as pessoas que pararam para assistir às filmagens. «Acção!», grita o realizador José Sacramento. Zé do Gancho e Manel Maneta fazem companhia aos dois amigos, à viola e à guitarra. No mesmo largo onde um dia já cantou Alfredo Marceneiro ouvem-se agora outras vozes. «O meu nome é Toni, e a mim chamam-me Zezé. Este é o bairro onde vivemos, por ele sofremos, estou à rasca do meu pé.»«‘Semos’ dois belos compinchas, que bonita a amizade. Que nos caia aqui um tijolo, e nos faça a cara num bolo, se isto não é verdade.»
A letra da música dá o mote para a entrada de Maria Rueff, de farta cabeleira loira e uma mala de peluche branco que a transformam na mulher de Zezé. Parte um tijolo na cabeça do marido e depois na de Toni. A assistência ri-se, faz comentários, discute se o tijolo é ou não verdadeiro... Tiago Almada, o segundo assistente de realização, já não sabe como há-de pedir silêncio. «Ficam já avisados que esta senhora vai partir um tijolo na cabeça deste senhor, por isso, por favor, não riam nem façam comentários», pede. De pouco serve. Resta a esperança de que os microfones apenas captem as vozes de Toni e Zezé.
Zé Cágado (Marco Horácio), Bifinhos (José Raposo), Galhetas (António Melo) e o Agente Ramalho (Joaquim Nicolau) juntam-se à cena, no meio de vários figurantes, para assistir à cantoria. José Pedro Gomes continua a divertir-se com a assistência. «Dona Eugénia, está a gostar?», pergunta a uma senhora que ali está há mais de uma hora. «Adorei vê-lo, espero que continue de boa saúde. E todos os outros também. Adoro-vos a todos», responde Maria Eugénia Peixe, 59 anos, bicaense de gema. Geninha mora ali mesmo ao lado e não resistiu a vir dar uma espreitadela. «Há sempre muitas filmagens aqui, mas esta é com artistas que nos enchem», explica. «O Zé Pedro meteu-se comigo e disse que o fado era dedicado a mim», conta, orgulhosa. Não costuma ir ao cinema, mas talvez seja desta que aceite o convite do vizinho Cabé e vá ver Conversa da Treta - O Filme."
Publicado por Gabriela Lourenço / VISÃO
O filme estará nas salas de cinema a partir de Outubro... A nao perder!